O consumo de insetos será uma tendência? Por Patricia Damy Benedetti
Publicado em 22/08/2.020.
Prevê-se que a população mundial venha a atingir 9 bilhões de pessoas em 2050. A nível mundial existem atualmente cerca de 1 bilhão de pessoas com escassez de recursos e que passam fome. Tendo isso em conta, deveremos avaliar e reavaliar o que consumimos e produzimos para criar uma forma de produção mais sustentável e que chegue a todos, como por exemplo, reduzindo o desperdício de alimentos.
Em várias regiões do planeta, os insetos comestíveis têm sido uma parte da dieta humana. Contudo, existe um grau de aversão ao seu consumo. Embora a maioria dos insetos recolhidos a partir de habitats florestais seja comestível, a inovação em sistemas de criação em massa já começou em muitos países. Estes animais são uma possível solução, pois são fáceis de produzir e podem ser criados à base de subprodutos agroalimentares. Assim, estes podem oferecer uma oportunidade significativa para juntar a ciência e os conhecimentos tradicionais tanto nos países desenvolvidos como nos em desenvolvimento, possibilitando a criação de uma nova fonte alimentar.
A entomofagia é uma prática humana com alguns milênios, constituindo parte fundamental da alimentação de muitas populações e também de outros primatas. Na África e na Ásia, por exemplo, comer insetos é uma prática corrente, sendo vista como uma forma sensata de aproveitar um recurso natural. No Japão, por exemplo, os insetos são aproveitados como recurso alimentar de grande valor. Mesmo na Europa, países como a Croácia e a Itália, consomem alguns produtos que contêm insetos que são considerados iguarias raras e “valiosas”.
De acordo com a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação, dois bilhões de pessoas no mundo são consumidoras de insetos. Embora seja relatado pela FAO que 1900 espécies podem ser ingeridas, reconhece-se que seu potencial como alimento é pouco explorado no mundo. Para promover a entomofagia, questões nutricionais, outras relacionadas ao meio ambiente e aos aspectos sociais do cultivo poderiam nortear essa ação. Insetos representam importantes fontes de proteína e de minerais de boa qualidade; quando criados em cativeiro, apresentam excelente conversão de ração em carne para consumo (podem converter dois quilos de ração em um quilo de massa); sua produção não requer volume de água excessivo e gera um menor volume de gases nocivos ao meio ambiente quando comparada com a de bovinos de corte. Para sua criação, não há necessidade de grandes áreas de cultivo e tampouco muito investimento em tecnologia, podendo ser uma alternativa para pequenos produtores rurais.
Os insetos podem ser consumidos em todos os estágios de desenvolvimento, mas é em forma de larva que a maioria das espécies registradas é consumida. Estudos têm demonstrado que a “carne” dos insetos contém quantidades de proteínas e lipídeos satisfatórias e são ricas em sais minerais e vitaminas. Por exemplo, a formiga da espécie cephalotes, conhecida como tanajura, possui mais proteínas (42,59%) do que a carne de frango (23%) ou bovina (20%).
A novidade é que eles começaram a chegar a restaurantes e prateleiras dos supermercados de grandes centros urbanos na Europa, Estados Unidos e, mais recentemente, no Brasil. A francesa Jimini´s foi uma das pioneiras. Criada em 2012, produz barras de cereais, massas e granolas à base de farinha de insetos, além de petiscos feitos com insetos desidratados e temperados, como larvas de tenébrio – uma espécie de besouro – com alho e ervas finas. Esses alimentos eram vendidos inicialmente pelo site da empresa. No começo de 2018, após a União Europeia aprovar e regulamentar o consumo de insetos, a Jimini´s passou a vender seus produtos em uma grande rede de supermercados na Espanha. Os insetos são criados em fazendas europeias. Já a norte-americana Chirps, importa matéria-prima para farinha, snacks e biscoitos da Tailândia, onde se calcula que existam 20 mil “fazendas de grilo” – o país é um dos líderes globais na área.
Na Alemanha, a Bug Foundation vende hambúrgueres que levam 45% de uma mistura proteica feita à base de soja e larvas do besouro Alphitobius diaperinus, conhecido no Brasil como cascudinho. De acordo com os fabricantes, o sabor lembra sementes de girassol ou amendoim. Os animais são criados na Holanda, um dos primeiros países ocidentais a permitir a comercialização e o consumo de produtos alimentícios contendo insetos.
Com alto valor proteico, grilos, larvas de besouros e formigas conquistam espaço como alternativa alimentar; o Brasil dá os primeiros passos para disputar esse mercado. Um novo ramo do setor agropecuário está se instalando em Piracicaba, uma biofábrica para a criação de grilos. O projeto de um sistema semiautomatizado para a produção em larga escala de Gryllus assimilis foi criado pela startup Hakkuna.
No futuro, um grande desafio para a humanidade é produzir alimentos em quantidade cada vez maior, os insetos poderiam ser uma importante fonte de alimentos. O valor nutricional é uma das grandes vantagens da entomofagia. É preciso tomar conhecimento dos hábitos alimentares e dos alimentos mais consumidos de maneira a recomendar os insetos como um complemento enriquecedor.
Acredito que, à medida que o consumo dos insetos for se popularizando e com menos preconceitos, começarão a ser mais consumidos e entrarão no processo industrial com diferentes produtos nutritivos.
Referências:
BLOG DA ALIMENTOS. Insetos comestíveis: uma alternativa de alimento para o futuro? Blog da Indústria de Alimentos. Conteúdos de dicas e curiosidades sobre a industrialização dos alimentos e bebidas. Disponível em: < https://www.instagram.com/blogdaalimentos/?hl=pt-br>. Acesso em: 10 ago. 2020.
CARDOSO, S. A. E. Utilização de insetos na alimentação humana e animal. 2016. Dissertação (Mestrado em Medicina Veterinária). Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias Faculdade de Medicina Veterinária. Disponível em: < http://recil.grupolusofona.pt/bitstream/handle/10437/7638/Tese%2036.>. Acesso em: 08 ago. 2020.
CHEUNG, T. L.; MORAES, M. S. Inovação no setor de alimentos: insetos para consumo humano. Interações, Campo Grande, MS, v. 17, n. 3, p. 503-515, jul./set. 2016. Disponível em: < https://www.scielo.br/pdf/inter/v17n3/1518-7012-inter-17-03-0503.pdf>. Acesso em: 09 ago. 2020.
PINTO, L. Insetos comestíveis: Mercado de milhões à prova em Carcavelos. 2019. Disponível em: <https://www.dinheirovivo.pt/economia/insetos-comestiveis-mercado-de-milhoes-a-prova-em-carcavelos/>. Acesso em 11 ago. 2020.
TUNES, S. Insetos Comestíveis. 2020. Disponível em: < https://revistapesquisa.fapesp.br/insetos-comestiveis/>. Acesso em: 10 ago. 2020.
Patricia de C. Damy Benedetti
Engenheira de Alimentos.
Coordenadora e Professora do curso de Engenharia de Alimentos da União das Faculdades dos Grandes Lagos-UNILAGO
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